Princípios Fundamentais da Administração Pública

Muitos são os princípios elencados pelos estudiosos, como sendo de imprescindível observância à pratica de todos os atos e atividades administrativas.

Os princípios fundamentais orientadores de toda a atividade da Administração Pública encontram-se, explícita ou implicitamente, no texto da Constituição de 1988. Muitas leis citam ou enumeram princípios administrativos; todos, evidentemente, encontram-se expressos ou são decorrência lógica das disposições constitucionais referentes à atuação da Administração Pública em geral.

Dentre os princípios norteadores da atividade administrativa, avultam em importância aqueles expressos no caput do art. 37 da Constituição. Após a promulgação da Emenda Constitucional nº 19/1998, cinco passaram a ser esses princípios explícitos, a saber (LIMPE): legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência (este último acrescentado pela emenda referida).

A Lei nº 9.784/1999, que trata dos processos administrativos no âmbito federal, também incluiu, em seu art. 2º, a eficiência no rol dos princípios que informam a Administração Pública, juntamente com os princípios da legalidade, da finalidade, da motivação, da razoabilidade, da proporcionalidade, da moralidade, da ampla defesa, do contraditório, da segurança jurídica e do interesse público.

Os princípios são as ideias centrais de um sistema, estabelecendo suas diretrizes e conferindo a ele um sentido lógico, harmonioso e racional, o que possibilita uma adequada compreensão de sua estrutura. Os princípios determinam o alcance e o sentido das regras de um dado subsistema do ordenamento jurídico, balizando a interpretação e a própria produção normativa.

Devemos notar que o art. 37 da Constituição de 1988 encontra-se inserido em seu Capítulo VII – “Da Administração Pública”, especificamente correspondendo à Seção I deste Capítulo, que trata das “Disposições Gerais”. Esse fato, ao lado da expressa dicção do dispositivo, torna claro que os princípios ali enumerados são de observância obrigatória para todos os Poderes, quando estiverem no exercício de funções administrativas, e para todos os entes federados (União, estados, Distrito Federal e municípios), alcançando a Administração Direta e a Indireta.

Princípios Primários (Básicos)

Princípios Básicos (LIMPE):

  • Legalidade;

  • Impessoalidade ou Finalidade;

  • Moralidade;

  • Publicidade;

  • Eficiência.

Princípio da Legalidade

A atividade administrativa estará sempre adstrita aos ditames da lei, os atos e contratos dela decorrentes para que produzam efeitos devem ser subordinados às regras e normas regedoras da matéria. Ao administrador só é permitido realizar o que estiver autorizado pela norma.

O princípio da legalidade é o postulado basilar de todos os Estados de Direito, consistindo, a rigor, no cerne da própria qualificação destes (o Estado é dito “de Direito” porque sua atuação está integralmente sujeita ao ordenamento jurídico, vigora o “império da lei”).

A formulação mais genérica deste princípio encontra-se no inciso II do art. 5º da Constituição, artigo no qual se inserem alguns dos mais importantes direitos e garantias fundamentais de nosso ordenamento. Lemos, no citado dispositivo, que “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”. Como o art. 5º trata de direitos individuais, sobretudo os inicialmente delineados pelo Liberalismo do século XVIII, voltados essencialmente, portanto, à proteção dos particulares contra o Estado, temos como corolário do inciso II do art. 5º que aos particulares é lícito fazer tudo aquilo que a lei não proíba.

Podemos de pronto perceber que a última asserção é inaplicável à atividade administrativa. Deveras, para os particulares a regra é a autonomia da vontade, ao passo que a Administração Pública não tem vontade autônoma, estando adstrita à lei, a qual expressa a “vontade geral”, manifestada pelos representantes do povo, único titular originário da “coisa pública”. Tendo em conta o fato de que a Administração Pública está sujeita, sempre, ao princípio da indisponibilidade do interesse público – e não é ela quem determina o que é de interesse público, mas somente a lei (e a própria Constituição), expressão legítima da “vontade geral” -, não é suficiente a ausência de proibição em lei para que a Administração Pública possa agir; é necessária a existência de uma lei que imponha ou autorize determinada atuação administrativa.

A Carta de 1988 não estabeleceu um enunciado específico para o princípio da legalidade administrativa. Conforme exposto, entretanto, pode-se afirmar que, no âmbito do direito administrativo, como decorrência do regime de direito público, a legalidade traduz a ideia de que a Administração Pública somente tem possibilidade de atuar quando exista lei que o determine (atuação vinculada) ou autorize (atuação discricionária), devendo obedecer estritamente ao estipulado na lei, ou, sendo discricionária a atuação, observar os termos, condições e limites autorizados na lei.

Essa é a principal diferença do princípio da legalidade para os particulares e para a Administração. Aqueles podem fazer tudo o que a lei não proíba; esta só pode fazer o que a lei determine ou autorize. Inexistindo previsão legal, não há possibilidade de atuação administrativa.

O princípio da legalidade administrativa tem, portanto, para a Administração Pública, um conteúdo muito mais restritivo do que a legalidade geral aplicável à conduta dos particulares (CF, art. 5º, 11). Por outro lado, para o administrado, o princípio da legalidade administrativa representa uma garantia constitucional, exatamente porque lhe assegura que a atuação da Administração estará limitada ao que dispuser a lei.

Segundo Celso Antônio Bandeira de Mello, o princípio da legalidade representa a consagração da ideia de que a Administração Pública só pode ser exercida conforme a lei, sendo a atividade administrativa, por conseguinte, sublegal ou infralegal, devendo restringir-se à expedição de comandos que assegurem a execução da lei. Como a lei consubstancia, por meio de comandos gerais e abstratos, a vontade geral, manifestada pelo Poder que possui representatividade para tanto – o Legislativo -, o princípio da legalidade possui o escopo de garantir que a atuação do Poder Executivo nada mais seja senão a concretização dessa vontade geral.

Em suma, a Administração, além de não poder atuar contra a lei ou além da lei, somente pode agir segundo a lei (a atividade administrativa não pode ser contra legem nem praeter legem, mas apenas secundum legem). Os atos eventualmente praticados em desobediência a tais parâmetros são atos inválidos e podem ter sua invalidade decretada pela própria Administração que os haja editado (autotutela administrativa) ou pelo Poder Judiciário.

Observe-se, ainda, que, em sua atuação, a Administração está obrigada à observância não apenas do disposto nas leis, mas também dos princípios jurídicos (“atuação conforme a lei e o Direito”, na feliz redação do inciso I do parágrafo único do art. 2º da Lei nº 9. 784/1999). Ademais, a Administração está sujeita a seus próprios atos normativos, expedidos para assegurar o fiel cumprimento das leis, nos termos do art. 84, inciso IV, da Constituição. Assim, na prática de um ato individual, o agente público está obrigado a observar não só a lei e os princípios jurídicos, mas também os decretos, as portarias, as instruções normativas, os pareceres normativos, em suma, os atos administrativos gerais que sejam pertinentes àquela situação concreta com que ele se depara.

É importante enfatizar que a edição de atos normativos pela Administração Pública só é legítima quando exercida nos estritos limites da lei, para o fim de dar fiel execução a esta. A atividade normativa administrativa típica não pode inovar o ordenamento jurídico, não pode criar direitos ou obrigações novos, que não estejam, previamente, estabelecidos em lei, ou dela decorram.

Devemos observar que a possibilidade de o Poder Executivo expedir atos que inaugurem o direito positivo somente existe nas situações expressamente previstas no próprio texto constitucional. Tais hipóteses possuem caráter excepcional, sendo as principais a edição de medidas provisórias “com força de lei” (CF, art. 62) e de leis delegadas, cuja edição deve ser autorizada por resolução do Congresso Nacional (CF, art. 68).

Merece menção, ainda, a atribuição, bastante restrita, acrescentada pela EC nº 32/2001, de edição de decretos autônomos pelo Poder Executivo, ou seja, decretos que retiram seu fundamento de validade diretamente do texto constitucional, atos primários, isto é, que não são editados em função de qualquer lei, não regulamentam lei alguma.

As matérias a serem disciplinadas por meio de decreto autônomo (matérias submetidas à denominada “reserva de Administração”) estão descritas no art. 84, inciso VI, da Constituição. São, exclusivamente, as seguintes: (a) organização e funcionamento da Administração federal, desde que não implique aumento de despesa nem criação ou extinção de órgãos públicos; e (b) extinção de cargos ou funções públicas, quando vagos. O art. 84 da Constituição aplica-se ao Presidente da República (à esfera federal, portanto). Entendemos que, por simetria, tais atribuições podem ser exercidas pelos Governadores e Prefeitos, desde que lhes dê competência a respectiva Constituição estadual ou Lei Orgânica municipal (ou do Distrito Federal).

Princípio da Impessoalidade ou Finalidade

Nada mais é do que a reiteração da finalidade da administração, ou seja, impõe-se aqui que todo o ato tenha por objetivo o interesse público, proibindo-se que sejam executados por perseguição a agentes administrativos, ou para satisfazer interesses pessoais ou de terceiros não coincidentes com os da coletividade.

Os autores tratam do princípio administrativo da impessoalidade sob dois prismas, a saber:

  1. Como determinante da finalidade de toda a atuação administrativa (também chamado princípio da finalidade, considerado um princípio constitucional implícito, inserido no princípio expresso da impessoalidade);

Essa primeira é a acepção mais tradicional do princípio da impessoalidade, e traduz a ideia de que toda atuação da Administração deve visar ao interesse público, deve ter como finalidade a satisfação do interesse público.

A impessoalidade da atuação administrativa impede, portanto, que o ato administrativo seja praticado visando a interesses do agente ou de terceiros, devendo ater-se à vontade da lei, comando geral e abstrato em essência. Dessa forma, ele impede perseguições ou favorecimentos, discriminações benéficas ou prejudiciais aos administrados. Qualquer ato praticado com objetivo diverso da satisfação do interesse público será nulo por desvio de finalidade. Exemplo marcante de ofensa ao princípio da impessoalidade (e também ao da moralidade, entre outros) é a prática do nepotismo – nomeação de parentes para cargos cujo provimento não exija concurso público -, infelizmente ainda corriqueira em nossos meios políticos.

Segundo Celso Antônio Bandeira de Mello, a impessoalidade, especialmente na acepção ora em foco, é decorrência da isonomia (ou igualdade) e tem desdobramentos explícitos em dispositivos constitucionais como o art. 37, inciso II, que impõe o concurso público como condição para ingresso em cargo efetivo ou emprego público (oportunidades iguais para todos), e o art. 37, inciso XXI, que exige que as licitações públicas assegurem igualdade de condições a todos os concorrentes.

A finalidade da atuação da Administração pode estar expressa ou implícita na lei. Há sempre uma finalidade geral, que é a satisfação do interesse público, e uma finalidade específica, que é o fim direto ou imediato que a lei pretende atingir.

Por exemplo, o ato de remoção tem a finalidade específica de adequar o número de servidores lotados nas diversas unidades administrativas de um órgão ou entidade às necessidades de mão-de-obra de cada unidade, conforme a disponibilidade total de servidores no órgão ou entidade. Se um ato de remoção é praticado com a finalidade de punir um servidor, que tenha cometido uma irregularidade, ou que trabalhe de forma insatisfatória, o ato será nulo, por desvio de finalidade, mesmo que existisse efetiva necessidade de pessoal no local para onde o servidor foi removido.

Observe-se que, no exemplo, a remoção não seria frontalmente contrária ao interesse público, não desatenderia abertamente a finalidade geral, porque realmente havia necessidade de pessoal na unidade para a qual o servidor foi deslocado, mas basta o desvio da finalidade específica para tomar o ato nulo.

Outro exemplo. Imagine-se que um servidor, um Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil, peça licença para capacitação, prevista no art. 87 da Lei nº 8.112/1990, a fim de participar de um curso de pintura em porcelana. São os seguintes os termos do citado dispositivo legal: “Após cada quinquênio de efetivo exercício, o servidor poderá, no interesse da Administração, afastar-se do exercício do cargo efetivo, com a respectiva remuneração, por até três meses, para participar de curso de capacitação profissional.” Suponhamos que a licença seja concedida.

Nesse caso, temos desvio da finalidade geral e da finalidade específica, pois o ato é contrário ao interesse público (o servidor ficará remuneradamente sem trabalhar para fazer um curso que não interessa a suas atribuições) e é contrário à finalidade específica da lei (pintura em porcelana não é, para esse servidor, “capacitação profissional”).

  1. Como vedação a que o agente público valha-se das atividades desenvolvidas pela Administração para obter promoção pessoal.

A segunda acepção do princípio da impessoalidade está ligada à ideia de vedação à pessoalização das realizações da Administração Pública, à promoção pessoal do agente público. Está consagrada no § 12 do art. 3º da Constituição, nestes termos:

“A publicidade dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos deverá ter caráter educativo, informativo ou de orientação social, dela não podendo constar nomes, símbolos ou imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos.”

Observa-se que esse segundo desdobramento do princípio da impessoalidade tem por escopo proibir a vinculação de atividades da Administração à pessoa dos administradores, evitando que estes utilizem a propaganda oficial para sua promoção pessoal.

Assim, uma obra pública realizada, por exemplo, pelo Estado do Rio de Janeiro, nunca poderá ser anunciada como realização de José da Silva, Governador, ou de Maria das Graças, Secretária Estadual de Obras, pela propaganda oficial. Será sempre o “Governo do Estado do Rio de Janeiro” o realizador da obra, vedada a alusão a qualquer característica do governante, inclusive a símbolos relacionados a seu nome.

Cabe anotar, por fim, que a Lei nº 9.784/1999 refere-se a ambas as acepções do princípio da impessoalidade, no seu art. 2º, parágrafo único, incisos lll e Xlll, abaixo transcritos:

“Art. 2º A Administração Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência. Parágrafo único. Nos processos administrativos serão observados, entre outros, os critérios de:

III – objetividade no atendimento do interesse público, vedada a promoção pessoal de agentes ou autoridades;

XIII – interpretação da norma administrativa da forma que melhor garanta o atendimento do fim público a que se dirige, vedada aplicação retroativa de nova interpretação.”

Princípio da Moralidade

Consiste em que a administração através de seus agentes deve agir com equilíbrio capaz de discernir as posturas éticas, o decoro, a boa fé, e diferenciar com clareza as condutas honestas das desonestas.

O princípio da moralidade toma jurídica a exigência de atuação ética dos agentes da Administração Pública. A denominada moral administrativa difere da moral comum, justamente por ser jurídica e pela possibilidade de invalidação dos atos administrativos que sejam praticados com inobservância deste princípio.

É importante compreender que o fato de a Constituição haver erigido a moral administrativa em princípio jurídico expresso permite afirmar que ela é um requisito de validade do ato administrativo, e não de aspecto atinente ao mérito. Vale dizer, um ato contrário à moral administrativa não está sujeito a uma análise de oportunidade e conveniência, mas a uma análise de legitimidade, isto é, um ato contrário à moral administrativa é nulo, e não meramente inoportuno ou inconveniente.

Em consequência, o ato contrário à moral administrativa não deve ser revogado, e sim declarado nulo. Mais importante, como se trata de controle de legalidade ou legitimidade, este pode ser efetuado pela Administração e, também, pelo Poder Judiciário (desde que provocado).

A moral administrativa liga-se à ideia de probidade (honestidade) e de boa-fé. A Lei nº 9.784/1999, no seu art. 2º, parágrafo único, refere-se a tais conceitos nestes termos: “nos processos administrativos serão observados, entre outros, os critérios de atuação segundo padrões éticos de probidade, decoro e boa-fé”.

Consoante formulado no “Código de Ética Profissional do Servidor Público Civil do Poder Executivo Federal” (Decreto nº 1.171/1994), “o servidor público não poderá jamais desprezar o elemento ético de sua conduta. Assim, não terá que decidir somente entre o legal e o ilegal, o justo e o injusto, o conveniente e o inconveniente, o oportuno e o inoportuno, mas principalmente entre o honesto e o desonesto”.

Para atuar observando a moral administrativa não basta ao agente cumprir formalmente a lei na frieza de sua letra. É necessário que se atenda à letra e ao espírito da lei, que ao legal junte-se o ético. Por essa razão, muito frequentemente os autores afirmam que o princípio da moralidade complementa, ou toma mais efetivo, materialmente, o princípio da legalidade.

A doutrina enfatiza que a moralidade administrativa independe da concepção subjetiva (pessoal) de conduta moral, ética, que o agente público tenha; importa, sim, a noção objetiva, embora indeterminada, passível de ser extraída do conjunto de normas concernentes à conduta de agentes públicos, existentes no ordenamento jurídico. O vocábulo “objetivo”, aqui, significa que não se toma como referência um conceito pessoal, subjetivo – referente ao sujeito – de moral, mas um conceito impessoal, geral, anônimo de moral, que pode ser obtido a partir da análise das normas de conduta dos agentes públicos presentes no ordenamento jurídico. É evidente que “moral administrativa” consiste em um “conceito jurídico indeterminado”, mas, repita-se, conquanto indeterminado, trata-se de conceito jurídico, portanto, objetivo – e não pessoal, subjetivo.

Frise-se este ponto: afirmam os administrativistas que esse conceito objetivo de moral administrativa pode ser extraído do ordenamento jurídico, a partir do conjunto de normas, de todos os níveis, que versam sobre conduta dos agentes públicos em geral. Assim, embora sem dúvida se trate de um conceito indeterminado, com uma zona de incerteza na qual as condutas poderão, ou não, ser enquadradas como contrárias à moral administrativa, o certo é que nenhuma relevância tem a opinião do agente que praticou o ato cuja moralidade esteja sendo avaliada. Importa unicamente o que se extrai do ordenamento jurídico acerca da conduta compatível com a moralidade administrativa.

Foi grande a preocupação da Constituição de 1988 com a moralidade administrativa, e o princípio se encontra resguardado em diversos dispositivos. Cada vez mais o Poder Judiciário tem conferido efetividade ao postulado e, hoje, não é raro depararmo-nos com sentenças e acórdãos invalidando atos ou procedimentos por ferirem a moralidade administrativa.

É ilustrativa dessa noção esta ementa, do Tribunal de Justiça de São Paulo: “o controle jurisdicional se restringe ao exame da legalidade do ato administrativo; mas por legalidade ou legitimidade se entende não só a conformação do ato com a lei, como também com a moral administrativa e com o interesse coletivo”.

O § 4º do art. 37 do Texto Magno cuida da lesão à moralidade, referindo-se à improbidade administrativa, nos seguintes termos:

“Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível.”

Com ênfase ainda maior, o art. 85, inciso V, da Carta da República tipifica como crime de responsabilidade os atos do Presidente da República que atentem contra a probidade administrativa.

Ao lado desses dispositivos, a Constituição confere aos particulares o poder de controlar o respeito ao princípio da moralidade administrativa, seja mediante provocação à própria Administração Pública, por exemplo, exercendo o direito de petição, seja por meio de ações judiciais diversas. Um importante meio de controle judicial da moralidade administrativa é a ação popular, remédio constitucional previsto no inciso LXXIII do art. 5º da Constituição nestes termos (grifamos):

“qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência;”

Princípio da Publicidade

Os atos da administração para surtirem efeitos externos perante terceiros, devem ser levados ao conhecimento público. O objetivo é o de submeter o ato ao controle dos interessados diretos e o povo em geral, conferindo-lhe transparência e moralidade.

O princípio da publicidade também apresenta uma dupla acepção em face do sistema decorrente da Constituição de 1988, a saber:

  1. Exigência de publicação em órgão oficial como requisito de eficácia dos atos administrativos gerais que devam produzir efeitos externos ou onerem o patrimônio público;

Nessa acepção, a publicidade não está ligada à validade do ato, mas à sua eficácia, isto é, enquanto não publicado, o ato não está apto a produzir efeitos. Evidentemente, em um Estado de Direito, é inconcebível a existência de atos sigilosos ou confidenciais que pretendam incidir sobre a esfera jurídica dos administrados, criando, restringindo ou extinguindo direitos, ou que onerem o patrimônio público.

Cabe observar que o parágrafo único do art. 61 da Lei nº 8.666/1993 estabelece como requisito indispensável de eficácia dos contratos administrativos a publicação resumida do seu instrumento na imprensa oficial.

  1. Exigência de transparência da atuação administrativa.

Essa acepção, derivada do princípio da indisponibilidade do interesse público, diz respeito à exigência de que seja possibilitado, da forma mais ampla possível, o controle da Administração Pública pelos administrados.

Um dispositivo que deixa bem clara essa exigência de atuação transparente é o inciso XXXIII do art. 5º da Constituição, reproduzido abaixo (deve-se observar que não se trata de um direito absoluto):

“XXXIII – todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado.”

Importante garantia individual apta a assegurar a exigência de transparência da Administração Pública é o direito de petição aos Poderes Públicos; o mesmo se pode dizer do direito à obtenção de certidões em repartições públicas (CF, art. 5º, XXXIV, “a” e “b”, respectivamente).

Decorrência lógica do princípio da transparência é a regra geral segundo a qual os atos administrativos devem ser motivados. Com efeito, a motivação (exposição, por escrito, dos motivos que levaram à prática do ato) possibilita o efetivo controle da legitimidade do ato administrativo pelos órgãos de controle e pelo povo em geral. De forma mais ampla, a cidadania fundamenta a exigência de motivação, uma vez que esta é essencial para assegurar o efetivo controle da Administração, inclusive o controle popular, uma das mais evidentes manifestações do exercício da cidadania.

O princípio da motivação dos atos administrativos não é um princípio que esteja expresso na Constituição para toda a Administração Pública. Entretanto, especificamente para a atuação administrativa dos tribunais do Poder Judiciário a motivação está expressamente exigida no texto constitucional, no art. 93, inciso X, transcrito abaixo (grifou-se):

“Art. 93. Lei complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal Federal, disporá sobre o Estatuto da Magistratura, observados os seguintes princípios:

X- as decisões administrativas dos tribunais serão motivadas e em sessão pública, sendo as disciplinares tomadas pelo voto da maioria absoluta de seus membros.”

Princípio da Eficiência

Esse princípio exige da administração pública uma conduta exercida com objetividade, e perfeição, alcançando resultados positivos.

A EC nº 19/1998 incluiu a eficiência como princípio expresso, no caput do art. 37 da Constituição, ao lado dos quatro princípios anteriormente estudados.

A introdução da eficiência, como princípio explícito, no caput do art. 37 da Carta da República, aplicável a toda atividade administrativa de todos os Poderes de todas as esferas da Federação, demonstra bem a concepção de Administração Pública propugnada pelos arautos da corrente política e econômica comumente denominada – em que pesem as críticas a esta expressão – neoliberalismo.

Conquanto perfilhem a assim chamada “doutrina do Estado mínimo”, esses teóricos reconhecem que a existência de uma Administração Pública é inevitável nas sociedades contemporâneas. Entendem, entretanto, que os controles a que está sujeita a Administração Pública, e os métodos de gestão que utiliza, acarretam morosidade, desperdícios, baixa produtividade, enfim, grande ineficiência, em comparação com a administração de empreendimentos privados. Propõem, dessa forma, que a Administração Pública aproxime-se o mais possível da administração das empresas do setor privado. Esse modelo de Administração Pública, em que se privilegia a aferição de resultados, com ampliação de autonomia dos entes administrativos e redução dos controles de atividades-meio, identifica-se com a noção de administração gerencial, e tem como postulado central exatamente o princípio da eficiência.

Exemplo típico de instrumento com essa finalidade – privilegiar a aferição do atingimento de resultados, com ampliação da autonomia administrativa de entidades e órgãos públicos, traduzida na redução dos controles das atividades-meio – são os contratos de gestão previstos no § 8º do art. 37 da Carta Política, dispositivo também incluído pela EC nº 19/1998.

Para a Professora Maria Sylvia Di Pietro o princípio em foco apresenta dois aspectos:

  1. Relativamente à forma de atuação do agente público, espera-se o melhor desempenho possível de suas atribuições, a fim de obter os melhores resultados;

  2. Quanto ao modo de organizar, estruturar e disciplinar a administração pública, exige-se que este seja o mais racional possível, no intuito de alcançar melhores resultados na prestação dos serviços públicos.

Exemplos de desdobramentos do princípio da eficiência, quanto ao primeiro aspecto, todos introduzidos pela EC nº 19/1998, são a exigência de avaliação especial de desempenho para a aquisição da estabilidade pelo servidor público e a perda do cargo do servidor estável “mediante procedimento de avaliação periódica de desempenho, na forma de lei complementar, assegurada ampla defesa” (CF, art. 41).

Outro exemplo, também quanto ao primeiro aspecto, temos no art. 39, § 2º, da Constituição:

“§ 2º A União, os Estados e o Distrito Federal manterão escolas de governo para a formação e o aperfeiçoamento dos servidores públicos, constituindo-se a participação nos cursos um dos requisitos para a promoção na carreira, facultada, para isso, a celebração de convênios ou contratos entre os entes federados.”

O objetivo do princípio da eficiência é assegurar que os serviços públicos sejam prestados com adequação às necessidades da sociedade que os custeia. A eficiência, aliás, integra o conceito legal de serviço público adequado (Lei nº 8.987/1995, art. 6º, § 1º).

A ideia de eficiência aproxima-se da de economicidade, princípio expresso no art. 70, caput, da Constituição, referente ao controle financeiro da Administração Pública. Busca-se o atingimento de objetivos traduzidos por boa prestação de serviços, do modo mais simples, mais rápido, e mais econômico, melhorando a relação custo/benefício da atividade da Administração. O administrador deve sempre procurar a solução que melhor atenda ao interesse público, levando em conta o ótimo aproveitamento dos recursos públicos, conforme essa análise de custos e benefícios correspondentes.

O constitucionalista Alexandre de Moraes define o princípio da eficiência como aquele que “impõe à Administração Pública direta e indireta e a seus agentes a persecução do bem comum, por meio do exercício de suas competências de forma imparcial, neutra, transparente, participativa, eficaz, sem burocracia, e sempre em busca da qualidade, primando pela adoção dos critérios legais e morais necessários para a melhor utilização possível dos recursos públicos, de maneira a evitar desperdícios e garantir-se uma maior rentabilidade social”.

Eficiência tem como corolário a boa qualidade. A partir da positivação desse princípio como norte da atividade administrativa, a sociedade passa a dispor de base jurídica expressa para exigir a efetividade do exercício de direitos sociais, como a educação e a saúde, os quais têm que ser garantidos pelo Estado com qualidade ao menos satisfatória. Pelo mesmo motivo, o cidadão passa a ter o direito de questionar a qualidade das obras e atividades públicas, exercidas diretamente pelo Estado ou por seus delegatários.

Note-se que, sendo um princípio expresso, a eficiência indiscutivelmente integra o controle de legalidade ou legitimidade, e não de mérito administrativo. Deveras, a atuação eficiente não é questão de conveniência e oportunidade administrativa, mas sim uma obrigação do administrador, vale dizer, não é cabível a Administração alegar que, dentre diversas atuações possíveis, deixou de escolher a mais eficiente porque julgou conveniente ou oportuno adotar uma outra, menos eficiente. Com isso, é possibilitada, em tese, a apreciação pelo Poder Judiciário de um ato administrativo quanto a sua eficiência (o ato ineficiente é ilegítimo, o que enseja sua anulação, ou, se a anulação causar ainda mais prejuízo ao interesse público, responsabilização de quem lhe deu causa).

Princípios Secundários

Princípios Secundários (SASHA CAIPIRM):

  • Segurança Jurídica;

  • Auto-Executoriedade;

  • Supremacia do Interesse Público;

  • Hierarquia;

  • Ampla defesa e Contraditório

  • Continuidade dos Serviços Públicos;

  • Autotutela;

  • Igualdade dos Administrados;

  • Presunção de Veracidade;

  • Indisponibilidade;

  • Razoabilidade e Proporcionalidade;

  • Motivação

Princípio da Segurança Jurídica

Consiste na defesa da boa fé dos administrados, na proteção e confiança, determinando que o interesse público em alguns casos deve-se voltar para a defesa de situações já consolidadas no tempo ainda que nascidas em condições irregulares ou mesmo ilegais. Certamente a remediação em tais hipóteses causaria mal maior do que a conservação da situação atual já consolidada.

Princípio da Auto-executoriedade

Após editados e publicados, a administração executa seus próprios atos, não precisando de ordem judicial, tem o poder de fazer cumprir as suas próprias determinações.

Princípio da Supremacia do Interesse Público

Intimamente ligado ao princípio da finalidade, sustenta a ideia de desigualdade necessária que deve haver entre o interesse público diante do interesse privado, aquele deve se sobrepujar a esse por ser inerente à atuação estatal.

O princípio da supremacia do interesse público é um princípio implícito. Embora não se encontre enunciado no texto constitucional, ele é decorrência das instituições adotadas no Brasil. Com efeito, por força do regime democrático e do sistema representativo, presume-se que toda atuação do Estado seja pautada pelo interesse público, cuja determinação deve ser extraída da Constituição e das leis, manifestações da “vontade geral”. Assim sendo, lógico é que a atuação do Estado subordine os interesses privados.

O princípio da supremacia do interesse público é característico do regime de direito público e, como visto anteriormente, é um dos dois pilares do denominado regime jurídico-administrativo, fundamentando todas as prerrogativas especiais de que dispõe a Administração como instrumentos para a consecução dos fins que a Constituição e as leis lhe impõem. Decorre dele que, existindo conflito entre o interesse público e o interesse particular, deverá prevalecer o primeiro, tutelado pelo Estado, respeitados, entretanto, os direitos e garantias individuais expressos na Constituição, ou dela decorrentes.

O Estado, portanto, embora tenha assegurada pela ordem constitucional a prevalência dos interesses em nome dos quais atua, está adstrito aos princípios constitucionais que determinam a forma e os limites de sua atuação, como o princípio do devido processo legal, do contraditório e ampla defesa, da proporcionalidade, dentre outros. Conforme se constata, assim como ocorre com todos os princípios jurídicos, o postulado da supremacia do interesse público não tem caráter absoluto.

É interessante notar, ainda, que, embora o princípio da supremacia do interesse público seja um dos dois postulados fundamentais do denominado regime jurídico-administrativo, ele não está diretamente presente em toda e qualquer atuação da Administração Pública.

Tem incidência direta, o princípio em foco, sobretudo nos atos em que a Administração Pública manifesta poder de império (poder extroverso), denominados, por isso, atos de império. São atos de império todos os que a Administração impõe coercitivamente ao administrado, criando unilateralmente para ele obrigações, ou restringindo ou condicionando o exercício de direitos ou de atividades privadas; são os atos que originam relações jurídicas entre o particular e o Estado caracterizadas pela verticalidade, pela desigualdade jurídica. Esses atos, sim, são fundados diretamente no princípio da supremacia do interesse público, base de todos os poderes especiais de que dispõe a Administração Pública para a consecução dos fins que o ordenamento jurídico lhe impõe.

Quando, entretanto, a Administração atua internamente, mormente em suas atividades-meio, praticando os denominados atos de gestão e atos de mero expediente, não há incidência direta do princípio da supremacia do interesse público, simplesmente porque não há obrigações ou restrições que necessitem ser impostas aos administrados. De um modo geral, também não há manifestação direta do princípio da supremacia do interesse público quando a Administração Pública atua como agente econômico, isto é, intervém no domínio econômico na qualidade de Estado-empresário, porque, nesses casos, a atuação da Administração Pública é regida predominantemente pelo direito privado (veja-se, por exemplo, o disposto no art. 173, § 1º, inciso 11, da Constituição).

Cumpre ressalvar, de qualquer forma, que, ao menos indiretamente, o princípio da supremacia do interesse público irradia, sim, sobre toda atuação administrativa, uma vez que, mesmo quando não são impostas obrigações ou restrições aos administrados, os atos da Administração Pública revestem aspectos próprios do direito público, a exemplo da presunção de legitimidade.

São exemplos de prerrogativas de direito público da Administração Pública, derivadas diretamente do princípio da supremacia do interesse público:

  1. As diversas formas de intervenção na propriedade privada, como a desapropriação (assegurada justa e prévia indenização); a requisição administrativa, em que o interesse público autoriza o uso da propriedade privada, sem remuneração, só havendo indenização ulterior, se houver dano; o tombamento de um imóvel de interesse histórico;

  2. A existência das denominadas cláusulas exorbitantes nos contratos administrativos, possibilitando à Administração, por exemplo, modificar ou rescindir unilateralmente o contrato;

  3. As diversas formas de exercício do poder de polícia administrativa, traduzidas na limitação ou condicionamento ao exercício de atividades privadas, tendo em conta o interesse público;

  4. A presunção de legitimidade dos atos administrativos, que impõe aos particulares o ônus de provar eventuais vícios que entendam existir no ato, a fim de obter uma decisão administrativa ou provimento judicial que afaste a sua aplicação.

Princípio da Hierarquia

A Administração Pública escalona os cargos, funções e empregos públicos dispostos. Em seus órgãos, numa vinculação de subordinação entre eles, com o objetivo de obter aproveitamento máximo na divisão das atribuições, e controle de uns sobre os outros do desempenho de tarefas.

Princípio da Ampla defesa e Contraditório

Por esse princípio permite-se aos participes do processo administrativo a possibilidade do contraditório e ampla defesa, ou seja, oportunidade de produzir alegações defensivas e apresentação de provas na defesa de seus interesses junto à administração.

Princípio da Continuidade dos Serviços Públicos

A atividade da administração é ininterrupta, seus serviços não podem ser paralisados. A Administração Pública é uma máquina em constante funcionamento.

O princípio da continuidade dos serviços públicos é um princípio implícito, decorrente do regime de direito público a que eles estão sujeitos. Deve-se observar que a expressão “serviços públicos”, aqui, é empregada em sentido amplo, abrangendo todas as atividades da Administração Pública regidas pelo direito público, e não apenas o fornecimento de utilidades fruíveis diretamente pela população.

Os serviços públicos, como seu nome indica, são prestados no interesse da coletividade, sob regime de direito público. Por esse motivo, sua prestação deve ser adequada, não podendo sofrer interrupções. A interrupção de um serviço público prejudica toda a coletividade, que dele depende para a satisfação de seus interesses e necessidades.

A aplicação desse princípio implica restrição a determinados direitos dos prestadores de serviços públicos e dos agentes envolvidos em sua prestação. Uma peculiaridade do princípio da continuidade dos serviços públicos é que sua observância é obrigatória não só para toda a Administração Pública, mas também para os particulares que sejam incumbidos da prestação de serviços públicos sob regime de delegação (concessionárias, permissionárias e autorizadas de serviços públicos).

Decorrência relevante do princípio da continuidade dos serviços públicos é o fato de o texto constitucional tratar a greve dos servidores públicos não como um direito auto-exercitável, de forma plena, independente de regulamentação legal, mas sim como um direito a ser exercido nos termos e limites definidos em lei específica.

Outro exemplo de restrição decorrente do princípio da continuidade dos serviços públicos é a impossibilidade de o particular prestador de serviço público por delegação interromper sua prestação, mesmo que o poder concedente descumpra os termos do contrato que tenha celebrado com ele. Essa restrição é a denominada inoponibilidade da “exceção do contrato não cumprido” (exceptio non adimpleti contractus). No caso da prestação de serviços públicos, o particular prejudicado pela Administração Pública somente poderá rescindir o contrato mediante sentença judicial transitada em julgado (Lei nº 8.987/1995, art. 39, parágrafo único).

A obrigação de que os serviços públicos prestados à população sejam adequados está expressa no art. 175, parágrafo único, inciso IV, da Constituição Federal. A Lei nº 8.987/1995, que regula a prestação de serviços públicos sob regime de concessão e de permissão, define serviço adequado como aquele que atenda aos requisitos nela expressos, dentre os quais se encontra o da continuidade.

Princípio da Autotutela

A administração é obrigada a policiar os bens públicos e os atos administrativos. O poder público tem o poder de defender e dar segurança ao seu patrimônio independentemente da intervenção do Poder Judiciário.

O princípio da autotutela, também referido como poder de autotutela administrativa pode ser, dependendo do caso, uma verdadeira prerrogativa ou um poder-dever da administração pública.

Como sabemos, no Brasil vigora o princípio da inafastabilidade de jurisdição, ou sistema de jurisdição única, segundo o qual a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito (CF, art. SQ, XXXV).

Ao lado dessa possibilidade absoluta de apreciação pelo Poder Judiciário, quando provocado, de atos que possam implicar lesão ou ameaça a direito, existe o poder administrativo de autotutela. O poder de autotutela possibilita à administração pública controlar seus próprios atos, apreciando-os quanto ao mérito e quanto à legalidade. É um princípio implícito, que decorre da natureza da atividade administrativa e de princípios expressos que a orientam, especialmente o princípio da legalidade. O controle de legalidade efetuado pela administração sobre seus próprios atos, evidentemente, não exclui a possibilidade de apreciação da legalidade desses pelo Poder Judiciário.

O princípio da autotutela instrumenta a Administração para a revisão de seus próprios atos, consubstanciando um meio adicional de controle da atuação da Administração Pública, e no que respeita ao controle de legalidade, reduzindo o congestionamento do Poder Judiciário.

Diz-se que o princípio da autotutela autoriza o controle, pela Administração, dos atos por ela praticados, sob dois aspectos:

  1. De legalidade, em que a Administração pode, de ofício ou provocada, anular os seus atos ilegais;

  2. De mérito, em que examina a conveniência e oportunidade de manter ou desfazer um ato legítimo, nesse último caso mediante a denominada revogação.

A Administração Pública, no desempenho de suas múltiplas atividades, está sujeita a erros; nessas hipóteses, ela mesma pode (e deve) tomar a iniciativa de repará-los, a fim de restaurar a situação de regularidade e zelar pelo interesse público. Não precisa, portanto, a Administração ser provocada para o fim de rever seus atos ilegais. Pode fazê-lo de ofício. Nesse aspecto, difere do controle judicial o controle administrativo de legalidade decorrente da autotutela, uma vez que para a realização daquele o Poder Judiciário necessita sempre ser provocado.

É importante frisar que não é só em relação a atos ilegais que a Administração pública exerce o poder-dever de autotutela, anulando-os. Os atos válidos, sem qualquer vício, que, no entender da Administração, se tomarem inconvenientes ao interesse público também podem ser retirados do mundo jurídico no uso da autotutela. Nessa hipótese, de revogação de um ato válido que se tomou inconveniente – verdadeiro poder da Administração Pública, exercido com suporte, também, no poder discricionário -, somente a própria Administração que editou o ato tem a possibilidade de controle. Vale dizer, o Poder Judiciário não pode retirar do mundo jurídico atos válidos editados por outro Poder.

Dessarte, o exercício do poder de autotutela pela Administração para o fim de revogar atos administrativos, com fundamento em razões de conveniência e oportunidade administrativas, sendo um poder discricionário, é de exercício exclusivo pela própria Administração que praticou o ato; o Poder Judiciário, no exercício da função jurisdicional, nunca aprecia a conveniência de um ato, mas tão-somente a sua legalidade e legitimidade.

Em suma, o princípio da autotutela autoriza a atuação da Administração de forma mais ampla do que ocorre no âmbito do controle judicial, uma vez que somente ela própria possui competência para revogar seus atos administrativos, e porque, tanto na revogação quanto na anulação, pode agir sem provocação (de ofício).

O princípio da autotutela administrativa está consagrado na Súmula 473 do STF, nestes termos:

“473 – A Administração pode anular seus próprios atos quando eivados de vícios que os tomem ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial.”

Por fim, alertamos que não se deve confundir poder de autotutela com tutela administrativa, expressão empregada como sinônimo de controle finalístico, ou supervisão, que a Administração Direta exerce, nos termos e limites da lei, sobre as entidades da Administração Indireta.

Princípio da Igualdade dos Administrados

Não se estabelecerá privilégios administrativos e de tratamento entre cidadãos.

Princípio da Presunção de Veracidade

Até prova em contrário, os atos da administração presumem-se verdadeiros. Toda ação administrativa, pelo simples fato de ter emanado do Poder público é presumivelmente legítima e deve ser cumprida. Isso não retira do interessado a possibilidade de requerer a apreciação, e manifestação quanto à legalidade da medida por parte do Poder Judiciário.

Princípio da Indisponibilidade do Interesse Público

A não ser que cumpridas certas formalidades, a administração não poderá dispor de seus bens e serviços, ou seja, os bens públicos não podem ser alienados com base na vontade dos governantes, eles formam o patrimônio do público. O governo não pode deixar de receber o que é de direito, nem dispor de bens. Pois a administração apenas gerencia os bens e os direitos do estado, o verdadeiro proprietário é o povo, sendo assim a sua vontade deve ser seguida; e a expressão da vontade do povo são as leis. Por esse motivo, qualquer atitude do governo deverá seguir a lei, e não o desejo dos governantes apenas.

O princípio da indisponibilidade do interesse público é um dos dois pilares do denominado regime jurídico-administrativo (o outro é o princípio da supremacia do interesse público, precedentemente estudado). Dele derivam todas as restrições especiais impostas à atividade administrativa. Tais restrições decorrem, exatamente, do fato de não ser a Administração Pública “dona” da coisa pública, e sim mera gestora de bens e interesses alheios (públicos, isto é, do povo).

Com efeito, em linguagem jurídica, diz-se que tem disposição sobre uma determinada coisa o seu proprietário. Quem não é proprietário de algo não dispõe desse algo, esse algo é, para ele, indisponível. Os bens e interesses públicos são indisponíveis, vale dizer, não pertencem à Administração, tampouco a seus agentes públicos. A esses cabe apenas a sua gestão, em prol da coletividade, verdadeira titular dos direitos e interesses públicos.

Em razão do princípio da indisponibilidade do interesse público (a expressão “interesse público” é utilizada, aqui, em sentido amplo, abrangendo todo o patrimônio público e todos os direitos e interesses, imediatos ou mediatos, do povo em geral, único titular da coisa pública) são vedados ao administrador quaisquer atos que impliquem renúncia a direitos do Poder Público ou que injustificadamente onerem a sociedade. Trata-se de um princípio implícito, e dele decorrem diversos princípios expressos que norteiam a atividade da Administração, como o da legalidade, o da impessoalidade, o da moralidade, o da eficiência.

Não se admite, por exemplo, que a Administração Pública renuncie ao recebimento de receitas devidas ao Estado, como multas, tributos, tarifas, salvo se houver enquadramento em alguma hipótese de renúncia expressamente prevista em lei (por exemplo, anistias, remissões, transações); essas receitas são receitas públicas, logo, só a lei pode dispensar sua exigência. Em decorrência do mesmo princípio, não é possível à Administração, tampouco, alienar qualquer bem público enquanto este estiver afetado a uma destinação pública específica. Mesmo quando desafetado o bem, deve sua alienação atender a urna série de condições legais, como a realização de licitação prévia, e, no caso de imóveis da Administração Direta, autarquias e fundações públicas, observar a exigência de autorização legislativa (Lei nº 8.666/1993, art. 17, inciso I).

É mister frisar que o princípio da indisponibilidade do interesse público está diretamente presente em toda e qualquer atuação da Administração Pública, diferentemente do que ocorre com o princípio da supremacia do interesse público, que, de forma direta, fundamenta essencialmente os atos de império do Poder Público.

Deveras, manifesta-se o princípio da indisponibilidade tanto no desempenho das atividades-fim, quanto no das atividades-meio da Administração, tanto quando ela atua visando ao interesse público primário, como quando visa ao interesse público secundário, tanto quando atua sob regime de direito público, como quando atua sob regime predominante de direito privado (a exemplo da atuação do Estado como agente econômico).

Conforme será visto adiante, o princípio da indisponibilidade do interesse público tem, no direito administrativo, estreita relação com o princípio da legalidade, não sendo raro o uso dessas expressões como se fossem sinônimas. Com efeito, justamente pelo fato de não ser a titular da coisa pública, de não ter disposição sobre a coisa pública, toda atuação da Administração deve atender ao estabelecido na lei, único instrumento hábil a determinar o que seja de interesse público. Afinal, a lei é a manifestação legítima daquele a quem pertence a coisa pública: o povo. O administrador não pode agir contrariamente ou além da lei, pretendendo impor o seu conceito pessoal de interesse público, sob pena de inquinar seus atos de desvio de finalidade. Deve, simplesmente, dar fiel cumprimento à lei, gerindo a coisa pública conforme o que na lei estiver determinado, ciente de que desempenha o papel de mero gestor de coisa que não é sua, mas do povo.

Interesses públicos primários e interesses públicos secundários

A abrangência do princípio da indisponibilidade do interesse público faz oportuna a referência a um ponto trabalhado pela doutrina italiana, concernente à distinção entre interesses públicos primários e interesses públicos secundários.

Os interesses públicos primários são os interesses diretos do povo, os interesses gerais imediatos. Já os interesses públicos secundários são os interesses imediatos do Estado na qualidade de pessoa jurídica, titular de direitos e obrigações. Esses interesses secundários são identificados pela doutrina, em regra, como interesses meramente patrimoniais, em que o Estado busca aumentar sua riqueza, ampliando receitas ou evitando gastos. Também são mencionados como manifestação de interesses secundários os atos internos de gestão administrativa, ou seja, as atividades-meio da Administração, que existem para fortalecê-la como organismo, mas que só se justificam se forem instrumentos para que esse organismo atue em prol dos interesses primários.

Em qualquer hipótese, o interesse público secundário só é legítimo quando não é contrário ao interesse público primário. Caso algum interesse público secundário seja contrário aos interesses públicos primários, nem mesmo poderá ser considerado interesse público, mas apenas um interesse administrativo ou governamental ilegítimo.

São exemplos de interesses secundários contrários ao interesse público primário, portanto, ilegítimos, apresentados pelo Prof. Celso Antônio Bandeira de Mello, o interesse que o Estado poderia ter em tributar desmesuradamente os administrados, ou pagar remunerações ínfimas a seus servidores, ou não pagar indenizações cíveis quando ocasionasse danos aos administrados, ou pagar indenizações irrisórias nas desapropriações. Em todos esses casos – suponha-se que as situações envolvessem a Administração federal -, a pessoa jurídica União poderia estar pretensamente perseguindo interesses seus, como pessoa jurídica titular de direitos, pois todos eles acarretariam um enriquecimento da pessoa União. Entretanto, como são interesses, nos exemplos dados, contrários ao interesse público primário, são interesses secundários e ilegítimos (nem mesmo são interesses públicos).

Diferentemente, quando a Administração, por exemplo, pretende adquirir bens comuns e realiza uma licitação a fim de obter propostas e selecionar aquela que apresente o menor preço, estará havendo coincidência entre o interesse público primário e o interesse público secundário (por isso, nesse caso, legítimo). Ademais, esses bens adquiridos devem ter como finalidade o exercício de atividades que direta ou indiretamente visem ao interesse público primário (não se justifica a aquisição de bens pela Administração, mesmo que pelo menor preço possível, se esses bens representarem mero acréscimo patrimonial ao acervo do Poder Público, sem utilização tendente à consecução, ao menos indiretamente, de um interesse público primário).

É claro que se o interesse público secundário devesse obrigatoriamente e sempre coincidir com o primário, o conceito de interesse público secundário não teria qualquer utilidade. Há, realmente, autores que consideram que, em ordenamentos jurídicos como o nosso, em que o texto constitucional estabelece inúmeras regras objetivas e princípios expressos de atuação da Administração Pública, essa distinção carece de sentido, porque se presume que toda e qualquer atuação legítima do Estado está, invariavelmente, voltada diretamente à consecução do interesse público primário.

Em nossa opinião, mesmo no Brasil é possível fazer a distinção doutrinária entre interesse público primário e interesse público secundário. Seguindo a orientação apontada pelo Prof. Celso Antônio Bandeira de Mello, caracterizamos como interesse público secundário legítimo aquele que represente um interesse de uma pessoa jurídica administrativa na qualidade de titular de direitos, mesmo sem implicar a busca direta da satisfação de um interesse primário, desde que: (a) não contrarie nenhum interesse público primário; e (b) possibilite atuação administrativa ao menos indiretamente tendente à realização de interesses primários.

A atuação de sociedades de economia mista exploradoras de atividades econômicas permite ilustrar situações em que estejam presentes as condições expostas no parágrafo precedente. Com efeito, essas entidades podem realizar operações cujo objetivo direto e imediato seja a obtenção de lucro para os seus acionistas (o que inclui o Estado). Desde que a operação não contrarie algum interesse público primário, será legítima e estará atendendo a um interesse público secundário (um interesse do próprio Estado, na qualidade de pessoa jurídica titular de direitos, não, diretamente, de gestor da coisa pública). Observe-se que os recursos que o Estado receberá, sob a forma de dividendos distribuídos aos acionistas, possibilitam sua atuação visando à satisfação de interesses públicos primários, ou seja, o atendimento a um interesse público secundário possibilitará, indiretamente, a persecução de interesses públicos primários.

Princípios da Razoabilidade e Proporcionalidade

Por esse princípio pretende-se evitar os excessos da administração, impondo aos gestores da coisa pública uma conduta moderada, adequando com proporcionalidade os meios para o alcance da finalidade pública desejada.

Os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade não se encontram expressos no texto constitucional. São eles, na verdade, princípios gerais de Direito, aplicáveis a praticamente todos os ramos da ciência jurídica.

Embora sejam implícitos, o Supremo Tribunal Federal, em diversos julgados, tem apontado como sede material expressa desses princípios o postulado do devido processo legal (CF, art. 5º, LIV), em sua acepção substantiva (substantive due process of law). Esse “aspecto substantivo” do princípio do devido processo legal diz respeito à proteção material direta dos bens e da liberdade em sentido amplo, isto é, à proteção direta desses bens jurídicos em si mesmos considerados, diferentemente do “aspecto formal ou adjetivo”, que diz respeito às garantias processuais (ampla defesa, contraditório, presunção de inocência, ônus da prova para a acusação, juiz natural, vedação a tribunais de exceção, dente outras), ou seja, aos instrumentos de proteção daqueles bens jurídicos.

Os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade vêm sendo seguidamente utilizados pelo Supremo Tribunal Federal no controle de constitucionalidade de leis.

É frequente os autores, e mesmo a jurisprudência, sobretudo no âmbito do direito constitucional, tratarem razoabilidade e proporcionalidade como um único e mesmo princípio jurídico, empregando esses termos como sinônimos, no mais das vezes dando preferência ao uso da expressão “princípio da proporcionalidade”. Na seara do direito administrativo, pensamos ser mais usual a referência a “princípio da razoabilidade” como um gênero, constituindo a noção de proporcionalidade uma de suas vertentes, comumente relacionada a situações que envolvam atos administrativos sancionatórios.

Seja como for, certo é que, no âmbito do direito administrativo, os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade encontram aplicação especialmente no controle de atos discricionários que impliquem restrição ou condicionamento aos direitos dos administrados ou imposição de sanções administrativas. Deve ser esclarecido desde logo que se trata de controle de legalidade ou legitimidade, e não de controle de mérito, vale dizer, não se avaliam conveniência e oportunidade administrativas do ato – o que implicaria, se fosse o caso, a sua revogação -, mas sim a sua validade. Sendo o ato ofensivo aos princípios da razoabilidade ou da proporcionalidade, será declarada sua nulidade; o ato será anulado, e não revogado.

É diante de situações concretas, sempre no contexto de uma relação meio-fim, que devem ser aferidos os critérios de razoabilidade e proporcionalidade, podendo o Poder Judiciário, desde que provocado, apreciar se as restrições impostas pela Administração Pública são adequadas, necessárias e justificadas pelo interesse público: se o ato implicar limitações inadequadas, desnecessárias ou desproporcionais (além da medida) deverá ser anulado.

Embora, conforme alertado anteriormente, não seja feita, muitas vezes, uma distinção precisa entre os dois princípios ora em tela, pensamos ser mais frequente os administrativistas associarem o princípio da razoabilidade às análises de adequação e de necessidade do ato ou da atuação da Administração Pública. Assim, não basta que o ato tenha uma finalidade legítima. É necessário que os meios empregados pela Administração sejam adequados à consecução do fim almejado e que sua utilização, especialmente quando se trate de medidas restritivas ou punitivas, seja realmente necessária.

De modo mais específico, o requisito da adequação obriga o administrador a perquirir se o ato por ele praticado mostra-se efetivamente apto a atingir os objetivos pretendidos (Alcançará o ato os resultados almejados?). Se não for adequado, é evidentemente ilegítima a prática do ato. Diz-se, nesse caso, que o ato é desarrazoado por inadequação (ressalvamos não ser incomum os autores e os tribunais falarem, em vez disso, em ato desproporcional; é frequente esses princípios serem citados de forma indiscriminada, como sinônimos).

Já o requisito necessidade concerne à exigibilidade ou não da adoção das medidas restritivas. Deve-se indagar se haveria um meio menos gravoso à sociedade e igualmente eficaz na consecução dos objetivos visados (Está desmedida, excessiva, desnecessária, a medida adotada? Os mesmos resultados não poderiam ser alcançados com medida mais prudente, mais branda, menos restritiva?). Em síntese, sempre que a autoridade administrativa tiver à sua disposição mais de um meio para a consecução do mesmo fim deverá utilizar aquele que se mostre menos gravoso aos administrados, menos restritivo aos direitos destes. Se for adotado um ato mais restritivo do que o estritamente necessário ao atingimento dos resultados pretendidos, diz-se que ele é desarrazoado (ou desproporcional) por falta de necessidade, por ser mais restritivo do que o necessário. Essa faceta do princípio da razoabilidade é às vezes citada como “princípio da proibição de excesso” (contudo, alertamos que “proibição de excesso” é também uma expressão frequentemente empregada de forma indiscriminada, muitas vezes como sinônimo de princípio da proporcionalidade).

Em resumo, o princípio da razoabilidade tem por escopo aferir a compatibilidade entre os meios empregados e os fins visados na prática de um ato administrativo, de modo a evitar restrições aos administrados inadequadas, desnecessárias, arbitrárias ou abusivas por parte da Administração Pública.

O eminente Prof. Celso Antônio Bandeira de Mello estabelece brilhantemente os contornos da razoabilidade e da proporcionalidade no âmbito do direito administrativo.

Para esse autor, significa o princípio da razoabilidade que “a Administração, ao atuar no exercício de discrição, terá que obedecer a critérios aceitáveis do ponto de vista racional, em sintonia com o senso normal de pessoas equilibradas e respeitosas das finalidades que presidiram a outorga da competência exercida. Vale dizer: pretende-se colocar em claro que não serão apenas inconvenientes, mas também ilegítimas – e, portanto, jurisdicionalmente invalidáveis -, as condutas desarrazoadas, bizarras, incoerentes ou praticadas com desconsideração às situações e circunstâncias que seriam atendidas por quem tivesse atributos normais de prudência, sensatez e disposição de acatamento às finalidades da lei atributiva da discrição manejada”.

O princípio da proporcionalidade (citado por alguns autores, conforme antes referido, como “princípio da proibição de excesso”), segundo a concepção a nosso ver majoritária na doutrina administrativista, representa, em verdade, uma das vertentes do princípio da razoabilidade. Isso porque a razoabilidade exige, entre outros aspectos, que haja proporcionalidade entre os meios utilizados pelo administrador público e os fins que ele pretende alcançar. Se o ato administrativo não guarda uma proporção adequada entre os meios empregados e o fim almejado, será um ato desproporcional, excessivo em relação a essa finalidade visada.

Impede o princípio da proporcionalidade que a Administração restrinja os direitos do particular além do que caberia, do que seria necessário, pois impor medidas com intensidade ou extensão supérfluas, desnecessárias, induz à ilegalidade do ato, por abuso de poder. Esse princípio fundamenta-se na ideia de que ninguém está obrigado a suportar restrições em sua liberdade ou propriedade que não sejam indispensáveis, imprescindíveis à satisfação do interesse público.

O postulado da proporcionalidade é importante, sobretudo, no controle dos atos sancionatórios, especialmente nos atos de polícia administrativa. Com efeito, a intensidade e a extensão do ato sancionatório deve corresponder, deve guardar relação de proporcionalidade com a lesividade e gravidade da conduta que se tenciona reprimir ou prevenir. A noção é intuitiva: uma infração leve deve receber uma sanção branda; a uma falta grave deve corresponder uma sanção severa.

É mister registrar que alguns autores referem-se a “proporcionalidade em sentido estrito” com um sentido um pouco diferente desse que se vem expor. Para eles, a verificação de “proporcionalidade em sentido estrito” consiste em perquirir se as restrições decorrentes do ato são compensadas pelos benefícios que ele proporciona, ou seja, verifica-se se a prática do ato mais promove do que restringe direitos fundamentais, se há mais “prós” do que “contras” na sua adoção, se a “resultante” favorece mais do que prejudica o conjunto dos direitos constitucionalmente protegidos. Se as restrições decorrentes do ato não forem sobrepujadas pelas vantagens proporcionadas ao interesse público com a sua adoção, ele não pode ser praticado, será ilegítima a sua prática.

É oportuno observar que, na Lei nº 9.784/1999, razoabilidade e proporcionalidade são princípios expressos (art. 2º, caput). Além disso, a lei explicita o conteúdo desses princípios, ao determinar que deverá ser observada, nos processos administrativos, “adequação entre meios e fins, vedada a imposição de obrigações, restrições e sanções em medida superior àquelas estritamente necessárias ao atendimento do interesse público” (art. 2º, parágrafo único, VI).

Formulemos um exemplo um tanto exagerado para tomar bem nítida a aplicação desses princípios.

Imagine-se que um agente da vigilância sanitária de um município, em visita a um grande supermercado, encontrasse em uma prateleira alguns pacotes de uma determinada marca de biscoitos uns dois ou três dias fora do prazo de validade. O agente, então, como sanção administrativa, decreta a interdição do estabelecimento por 15 dias. Uma lei do hipotético município determina como possíveis sanções para estabelecimentos que ofereçam à população alimentos inadequados ao consumo, aplicáveis a critério da autoridade administrativa, conforme a gravidade e as consequências da infração: (a) multa; (b) apreensão e destruição das mercadorias impróprias; e (c) interdição do estabelecimento por até 15 dias.

Nesse exemplo, fica claro que o meio utilizado pelo agente – interdição do estabelecimento – desatendeu aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. Embora a finalidade de sua atuação fosse a defesa do interesse público (proteção dos consumidores), ele possuísse competência para decretar a interdição do estabelecimento e supondo que houvesse atendido às formalidades legais para a aplicação da sanção, podemos dizer que houve inadequação do instrumento utilizado para a obtenção do fim visado. Além disso, dentre as possibilidades de atuação que poderiam apresentar o mesmo resultado, o agente escolheu aquela mais gravosa ao particular e até à coletividade. O agente poderia ter obtido a desejada proteção dos consumidores simplesmente determinando a apreensão e a destruição dos biscoitos vencidos e punindo o responsável pelo supermercado com a aplicação de uma multa.

Verifica-se, ainda, que a sanção aplicada não foi proporcional à falta cometida. Ora, se o agente aplicou a sanção mais rigorosa prevista na lei pelo motivo citado, qual seria a sanção aplicável a um supermercado em que muitos alimentos, incluindo peixes, carnes, enlatados estivessem francamente estragados, oferecendo muito mais sérios riscos aos consumidores? Teria que ser aplicada a mesma sanção, uma vez que a interdição do estabelecimento pelo prazo de 15 dias era a sanção mais grave prevista na lei.

Portanto, em nosso exemplo, o ato administrativo de interdição do estabelecimento poderia ser anulado pelo Poder Judiciário, em razão de haver a Administração menoscabado os princípios implícitos da razoabilidade (os meios utilizados não foram adequados ao fim visado, causando mesmo mais transtornos do que oferecendo segurança à população, e não havia necessidade da utilização de um meio tão gravoso para a garantia da defesa dos consumidores) e da proporcionalidade (a Administração aplicou a mais rigorosa dentre as sanções legais para punir uma falta evidentemente leve).

Quanto à importância desses princípios, é mister enfatizar que, independentemente da distinção que os administrativistas e a jurisprudência façam – quando fazem alguma – entre razoabilidade e proporcionalidade, há consenso sobre serem instrumentos dos mais relevantes para o controle da legitimidade do exercício do poder discricionário pela Administração Pública. Essa aferição dos limites do exercício legítimo do poder discricionário visa a evitar o indevido uso da discricionariedade administrativa, como manto protetor de atos que, embora praticados sob o fundamento da discricionariedade, revistam-se, em verdade, de arbitrariedade. A exigência de observância desses princípios impõe limitações à discricionariedade administrativa, ampliando os aspectos de controle do ato administrativo realizado pelo Poder Judiciário (embora a própria Administração Pública, no exercício do seu poder de autotutela, possa, ela mesma, anular um ato seu por considerá-lo desarrazoado ou desproporcional, a verdade é que, na prática, esse controle é realizado na quase totalidade dos casos pelo Poder Judiciário).

Nunca é demais frisar que, embora razoabilidade e proporcionalidade sejam princípios utilizados para controlar a discricionariedade administrativa, não se trata de controle de mérito administrativo. Vale dizer, o ato que fira a razoabilidade ou proporcionalidade é um ato ilegítimo (não é meramente inconveniente ou inoportuno), e deve ser anulado (não é cabível cogitar revogação sob o fundamento de que o ato seja desarrazoado ou desproporcional).

Assim, o controle da discricionariedade pelos princípios da razoabilidade e proporcionalidade deve ser entendido desta forma: quando a Administração pratica um ato discricionário além dos limites legítimos de discricionariedade que a lei lhe conferiu, esse ato é ilegal, e um dos meios efetivos de verificar sua ilegalidade é a aferição de razoabilidade e proporcionalidade. Ainda que a Administração alegue que agiu dentro do mérito administrativo, pode o controle de razoabilidade e proporcionalidade demonstrar que, na verdade, a Administração extrapolou os limites legais do mérito administrativo, praticando, por isso, um ato passível de anulação (controle de legalidade ou legitimidade), e não um ato passível de revogação (controle de mérito, de oportunidade e conveniência administrativas, que é sempre exclusivo da própria Administração Pública).

Finalizando, consideramos oportuno registrar que, em alguns casos, o princípio da razoabilidade tem sido empregado como critério de interpretação de outros princípios constitucionais, como é exemplo o princípio da igualdade. Situações que, à primeira vista, poderiam ser consideradas ofensivas ao princípio da isonomia, por implicarem discriminação entre indivíduos, têm sido consideradas legítimas pelos tribunais do Poder Judiciário, inclusive pelo Pretório Excelso. Assim, com fundamento nesse princípio implícito, o Supremo Tribunal Federal tem considerado legítimas certas restrições impostas em concursos públicos (por exemplo, limite de idade, altura mínima, graduação específica), desde que haja razoabilidade para o discrime.

Princípio da Motivação

A autoridade administrativa está subordinada a lei, assim como todos os membros do povo em um Estado de Direito, logo não mais admitem atos e decisões de governantes movidos por meros caprichos ou de cunho exclusivamente pessoal, haverá de ter sempre uma motivação justificando sua ação administrativa e submetendo-a ao crivo dos interessados e da comunidade em geral.

Bibliografia

Questões

Resolução de Questões de Concursos Anteriores

TRT 15º Região – Técnico Administrativo – 2013 – FCC

Os princípios que regem a Administração pública podem ser expressos ou implícitos. A propósito deles é possível afirmar que:

a) moralidade, legalidade, publicidade e impessoalidade são princípios expressos, assim como a eficiência, hierarquicamente superior aos demais.

b) supremacia do interesse público não consta como princípio expresso, mas informa a atuação da Administração pública assim como os demais princípios, tais como eficiência, legalidade e moralidade.

c) os princípios da moralidade, legalidade, supremacia do interesse público e indisponibilidade do interesse público são expressos e, como tal, hierarquicamente superiores aos implícitos.

d) eficiência, moralidade, legalidade, impessoalidade e indisponibilidade do interesse público são princípios expressos e, como tal, hierarquicamente superiores aos implícitos.

e) impessoalidade, eficiência, indisponibilidade do interesse público e supremacia do interesse público são princípios implícitos, mas de igual hierarquia aos princípios expressos.

RESPOSTA: B

Os princípios Expressos são: Legalidade, Impessoalidade, Moralidade, Publicidade e Eficiência (esse último princípio foi incluído na CF expressamente através da Emenda n°19).

O Item A está incorreto pois não hierarquia entre os princípios expressos.

MPE-AP – Técnico Ministerial – 2012 – FCC

O Prefeito de determinado Município, a fim de realizar promoção pessoal, utilizou-se de símbolo e de slogan que mencionam o seu sobrenome na publicidade institucional do Município. A utilização de publicidade governamental para promoção pessoal de agente público viola o disposto no artigo 37, § 1o , da Constituição Federal, ora transcrito: “A publicidade dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos deverá ter caráter educativo, informativo ou de orientação social, dela não podendo constar nomes, símbolos ou imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos”.

O fato narrado constitui violação ao seguinte princípio da Administração Pública, dentre outros:

a) Eficiência.

b) Publicidade.

c) Razoabilidade.

d) Impessoalidade.

e) Supremacia do Interesse Particular sobre o Público.

RESPOSTA: D

Violar o princípio da publicidade é não publicar. Promoção Pessoal afeta o princípio da Finalidade, ou Impessoalidade.

TJ-PE – Técnico Judiciário – 2012 – FCC

Tendo em vista os princípios constitucionais que regem a Administração Pública é INCORRETO afirmar que a

a) eficiência, além de desempenhada com legalidade, exige resultados positivos para o serviço público e satisfatório atendimento das necessidades da comunidade e de seus membros.

b) lei para o particular significa pode fazer assim, e para o administrador público significa deve fazer assim.

c) moral administrativa é o conjunto de regras que, para disciplinar o exercício do poder discricionário da Administração, o superior hierárquico impõe aos seus subordinados.

d) publicidade não é elemento formativo do ato; é requisito de eficácia e moralidade

e) impessoalidade permite ao administrador público buscar objetivos ainda que sem finalidade pública e no interesse de terceiros.

RESPOSTA: E

TJ-RJ – Técnico Judiciário – 2012 – FCC

O princípio da supremacia do interesse público

a) informa toda a atuação da Administração Pública e se sobrepõe a todos os demais princípios e a todo e qualquer interesse individual.

b) está presente na elaboração da lei e no exercício da função administrativa, esta que sempre deve visar ao interesse público.

c) informa toda a atuação da Administração Pública, recomendando, ainda que excepcionalmente, o descumprimento de norma legal, desde que se comprove que o interesse público restará melhor atendido.

d) traduz-se no poder da Administração Pública de se sobrepor discricionariamente sobre os interesses individuais, dispensando a adoção de formalidades legalmente previstas.

e) está presente na atuação da Administração Pública e se consubstancia na presunção de veracidade dos atos praticados pelo Poder Público.

RESPOSTA: B

TRT 6ª Região – Técnico Judiciário – 2012 – FCC

A aplicação do princípio da impessoalidade à Administração Pública traduz-se, dentre outras situações, na

a) proibição de identificação de autoria em qualquer requerimento dirigido à Administração, restringindo- se a indicação numérica para, ao fim do processo, notificar o interessado.

b) atuação feita em nome da Instituição, ente ou órgão que a pratica, sempre norteada ao interesse público, não sendo imputável ao funcionário que a pratica, ressalvada a responsabilidade funcional específica.

c) conduta da Administração não visar a prejudicar ou beneficiar pessoas, salvo se, por consequência indireta, atingir finalidade de interesse público.

d) conduta da Administração ser geral e indeterminada, de modo que qualquer benefício concedido a um funcionário, ainda que por força de ordem judicial, deve ser obrigatoriamente estendido a todos os demais na mesma situação.

e) atuação da Administração não reconhecer direito individual de servidor, somente podendo processar requerimentos coletivos para a obtenção de benefícios.

RESPOSTA: B

A letra diz que o funcionário terá a responsabilidade, porém não será valorizado pela autoria, já que esta é da Administração pública. É o mesmo problema da promoção pessoal em inauguração de obras.

TRT 6ª Região – Técnico Judiciário – 2012 – FCC

Pode-se, sem pretender esgotar o conceito, definir o princípio da eficiência como princípio

a) constitucional que rege a Administração Pública, do qual se retira especificamente a presunção absoluta de legalidade de seus atos.

b) infralegal dirigido à Administração Pública para que ela seja gerida de modo impessoal e transparente, dando publicidade a todos os seus atos.

c) infralegal que positivou a supremacia do interesse público, permitindo que a decisão da Administração sempre se sobreponha ao interesse do particular.

d) constitucional que se presta a exigir a atuação da Administração Pública condizente com a moralidade, na medida em que esta não encontra guarida expressa no texto constitucional.

e) constitucional dirigido à Administração Pública para que seja organizada e dirigida de modo a alcançar os melhores resultados no desempenho de suas funções.

RESPOSTA: E

TST – Técnico Judiciário – 2012 – FCC

Segundo a literalidade do caput do art. 37 da Constituição de 1988, a Administração pública obedecerá, entre outros, ao princípio da

a) proporcionalidade.

b) razoabilidade.

c) igualdade.

d) moralidade.

e) boa-fé.

RESPOSTA: D

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência – LIMPE.

TER-PE – Analista Judiciário – 2011 – FCC

As contratações com o Poder Público estão sujeitas, como regras, ao procedimento de seleção de propostas mais vantajosas para a Administração. Nesse sentido, o principio, tido por instrumental, de realização dos princípios da moralidade administrativa e do tratamento isonômico dos eventuais contratantes com o Poder Público, é classificado como da

a) reserva legal.

b) impessoalidade.

c) publicidade.

d) licitação.

e) eficiência.

RESPOSTA: D

Segundo o ensinamento do Professor José Afonso da Silva:

“O principio da licitação significa que essas contratações ficam sujeitas, como regras, ao procedimento de seleção de propostas mais vantajosas para a administração publica. Constitui um principio instrumental de realização dos princípios da moralidade administrativa e do tratamento isonômico dos eventuais contratantes com o poder publico”. (1994, p.573).

TRF 5ª Região – Técnico Judiciário – 2008 – FCC

Os princípios informativos do Direito Administrativo

a) ficam restritos àqueles expressamente previstos na Constituição Federal.

b) consistem no conjunto de proposições que embasa um sistema e lhe garante a validade.

c) ficam restritos àqueles expressamente previstos na Constituição Federal e nas Constituições Estaduais.

d) são normas previstas em regulamentos da Presidência da República sobre ética na Administração Pública.

e) são regras estabelecidas na legislação para as quais estão previstas sanções de natureza administrativa.

RESPOSTA: B

Os princípios, na definição básica de Gasparini (2003), são um “conjunto de proposições que alicerçam ou embasam um sistema legal e lhe garantem a validade”

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